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23 de Abril de 2024

Teori e Direito: duas mortes, o Mensalão e a Lava Jato

Teori Zavascki (1948 – 2017).

Publicado por Vanda Lopes
há 7 anos

Teori e Direito duas mortes o Mensalo e a Lava Jato

Teori Zavascki (1948 – 2017)

Há dois anos e 10 meses, os brasileiros começaram a se acostumar com um nome e um sobrenome incomuns, porém sonoros. Teori Zavascki, em março de 2014, era o ministro que comandaria a Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF).

A maior e mais dramática operação investigativa da história do país teria agora, quase três anos após seu início, um capítulo explosivo: a homologação das delaçōes premiadas de 77 executivos e ex-executivos da maior empreiteira do Brasil, a Odebrecht. Caberia a Zavascki decidir, nas próximas semanas, se aceitava ou não as delações e dar, assim, encaminhamento a novas revelações que envolveriam ainda mais autoridades brasileiras. Essa decisão não caberá mais a Zavascki.

Aos 68 anos, o catarinense da pequena Faxinal dos Guedes era um dos passageiros do avião que caiu na tarde desta quinta-feira (19/01) em Paraty, litoral sul do Rio de Janeiro. Ele saiu de São Paulo e iria para Angra dos Reis. Nenhum dos passageiros sobreviveu.

O ministro do Supremo deixa três filhos e uma enteada do segundo casamento. Enquanto enfrentava grandes desafios profissionais no Supremo, Zavascki encarava dramas pessoais. Em 2013 ficou viúvo da juíza federal Maria Helena Marques de Castro Zavascki, que faleceu em decorrência de um câncer. Dois anos depois, em 2016, foi a vez do ministro se despedir da mãe, Pia Fontana Zavascki, que viveu até os 101 anos.

Especialista em Direito Processual, chegou em Brasilia no início de 2003, indicado por Fernando Henrique Cardoso no ano anterior e nomeado por Luiz Inácio Lula da Silva para ser ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Tinha na bagagem 14 anos de experiência como desembargador do Tribunal Regional Federal da 4 Região (sul do país). Foram quase dez anos no STJ.

A ex-presidente Dilma Rousseff considerava Zavascki a sua melhor indicação para o Supremo Tribunal Federal. A mais de um interlocutor, Dilma confidenciara que entendia ser Zavascki o dono da melhor postura e equilíbrio entre os ministros do STF, um paradigma para as indicações futuras.

O nome dele sempre fora levado ao antecessor de Dilma, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas por uma série de razões, Zavascki nunca chegou no nível de indicação durante os oito anos de governo Lula. Por mais de uma ocasião, o ex-ministro Nelson Jobim e também o ministro do STF Gilmar Mendes citaram Zavascki, então no STJ, como um nome para o Supremo. Ele só chegou lá no fim de 2012, no segundo ano do governo Dilma. Foi uma indicação relâmpago: Cezar Peluso se aposentou no dia 3 de setembro de 2012 e a indicação ocorreu uma semana depois.

Mas Zavascki sabia que os nove anos de experiência nos julgamentos de casos de direito público no STJ não o socorreriam totalmente na sabatina no Senado. Em meio ao ruidoso julgamento da Ação Penal 470, conhecida como Mensalão, ele antevia que seria questionado sobre questões penais pelos parlamentares. Para isso, tomou uma decisão interessante. Buscou ajuda de colegas do STJ, experientes na área, para indicações de livros, especialmente de direito processual penal. Fez um “intensivão” sem nem sonhar que, apenas dois anos depois, herdaria o maior caso penal da história do país.

Um dia antes de assumir o cargo no STF, Zavascki disse que a TV Justiça tinha um ponto negativo, que era o “excesso da exposição que às vezes não colabora para um julgamento tranquilo, sereno. Para meu gosto pessoal, tem de repensar isso”. Uma frase que, segundo colegas, refletia perfeitamente seu posicionamento: de estilo sóbrio e avesso a holofotes.

“Não perde a Lava Jato, perde o Brasil um magistrado exemplar”, afirmou ao JOTA o amigo e ministro aposentado do STJ, Gilson Dipp. “Ele foi amigo de seus amigos”, completou.

Leitor voraz de livros jurídicos e também de literatura, Zavascki só deixava as emoções tomarem conta quando o assunto era o Grêmio. Fanático pelo clube de futebol, o ministro tinha os gabinetes no STJ e depois no STF cheios de pequenos adornos do clube gaúcho. Uma de suas últimas alegrias foi ver o time ser campeão da Copa do Brasil, há um mês.

A um amigo de Brasília, também gremista, ele disse há duas semanas que esperava com ansiedade pelo início da Taça Libertadores, campeonato que o Grêmio ganhou em 1983 e em 1995 e que voltaria a disputar agora em 2017.

Abaixo alguns depoimentos de atores da área jurídica e de políticos sobre o ministro Teori Zavascki.

Presidente do STF, ministra Cármen Lúcia

A consternação tomou conta do Supremo Tribunal Federal, neste 19 de janeiro, com a notícia da morte de um dos mais brilhantes juízes que ajudaram a construir a história deste Tribunal e do País. O ministro Teori Zavaski representa um dos pontos altos na história da nossa Justiça. O seu trabalho permanecerá para sempre, e a sua presença e o seu exemplo ficarão como um rumo do qual não nos desviaremos, cientes de que as pessoas morrem, suas obras e seus exemplos, não.

A morte põe fim a uma Vida, mas não acabam a amizade, a convivência nobre, gentil e fecunda do amigo dos amigos. Nem a generosidade com todos que caracterizava o ministro Teori Zavaski.

O sentimento de dor e de suade servirá de permanente lembrança para os compromissos que marcaram a vida do ministro, uma responsabilidade nossa, a fim de nos perseverarmos, também em sua homenagem, na mesma trilha.

O STF solidariza-se com a família do ministro Teori Zavaski e agradece as manifestações de pesar recebidas pela sua morte

Ministro Luís Roberto Barroso (STF)

Teori era um homem íntegro, preparado e trabalhador. Perco um amigo querido, que eu recebia em casa com frequência. O Tribunal perde um juiz especialmente vocacionado. E o país perde um grande homem. Somos todos vítimas de uma trapaça da sorte.

Ministra Laurita Vaz – presidente do STJ

“O Brasil perdeu hoje um dos mais brilhantes juristas que já tivemos. Por onde passou, conquistou o respeito de todos, não só pela sua notável inteligência e conhecimento, mas também pela sua honestidade e retidão. Não há palavras que expressem ou mensurem a falta que nos fará a extraordinária pessoa do grande amigo Teori. Que Deus nos dê resignação, e conforto à família do ministro diante de tão grande perda.”

Humberto Martins – vice-presidente do STJ

“O Brasil e a magistratura então de luto. Perde o Brasil um grande cidadão, a cidadania brasileira um grande cidadão e a magistratura um juiz exemplar. Foi meu amigo e meu companheiro de tribunal e de seção”.

Sérgio Moro – juiz federal, titular da condução da Operação Lava Jato em Curitiba

“Tive notícias do falecimento do ministro Teori Zavascki em acidente aéreo. Estou perplexo. Minhas condolências à família. O ministro Teori Zavascki foi um grande magistrado e um herói brasileiro. Exemplo para todos os juízes, promotores e advogados deste País. Sem ele, não teria havido Operação Lava Jato. Espero que seu legado de serenidade, seriedade e firmeza na aplicação da lei, independente dos interesses envolvidos, ainda que poderosos, não seja esquecido”

Rodrigo Janot – procurador geral da República

“Zavascki honrou o papel de magistrado, ao atuar de forma ética, isenta, discreta e extremamente técnica durante toda sua carreira. Na relatoria da Operação Lava Jato no STF, o ministro não hesitou em adotar medidas inéditas para a Suprema Corte, a pedido do Ministério Público Federal. É inegável e inquestionável a grande contribuição que o ministro Teori Zavascki deu ao Estado Democrático de Direito Brasileiro a partir de sua atuação como magistrado”.

O impacto da saída prematura de dois ministros sobre os maiores casos de corrupção da história

Num tribunal de apenas 11 peças, a troca de uma delas tem capacidade de alterar por completo os rumos da Corte. Mas duas dessas mudanças foram especialmente impactantes para os destinos dos dois maiores processos criminais da história do Supremo. Em 2009, o ministro Menezes Direito morreu, vitimado por um violento câncer no pâncreas e não pôde participar do julgamento do mensalão. Em 2017, o ministro Teori Zavascki morre num acidente de avião e, portanto, deixa a relatoria da Lava Jato, que descortinou o maior caso de corrupção da história do País.

Direito era uma referência para um grupo de ministros na sua época, integrado por Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Eros Grau. Experiente, discreto, conservador, contemporizador e muito bem articulado internamente, o ministro seria um fator de equilíbrio no turbulento julgamento do mensalão. A aposta é dos próprios integrantes do tribunal. Direito, dizem eles, fez muita falta.

Indicativo do papel relevante que poderia ter exercido é o fato, certamente pouco lembrado, de que Direito, em sua curta passagem pelo tribunal, foi sempre o novato, o mais recente dos juízes do Supremo. Sua atuação, porém, nunca foi de um recém-chegado. Direito funcionava como um decano sem o ser.

Buscou ser “algodão entre os cristais”, expressão usada comumente pelo ministro Marco Aurélio, num momento em que alguns ministros viviam às turras em plenário. Desviou-se desta postura apenas uma vez, quando reagiu nos bastidores contra o ministro Joaquim Barbosa, que havia discutido em plenário com Gilmar Mendes e dito que não era um de seus “capangas do Mato Grosso”. Naquele episódio, articulou a divulgação de uma nota contundente contra Barbosa que poderia gerar consequências para o colega. Nota que acabou por não ser publicada.

Zavascki, mais do que Direito, era referência para o tribunal como um todo, não apenas para um grupo de ministros. Por ser um juiz igualmente discreto, mas acima de tudo por ser ponderado, sereno, avesso a declarações públicas – e políticas – e pouco permeável a pressões da opinião pública, o ministro era a pessoa certa para relatar os processos abertos em razão da Operação Lava Jato. Quem disse isso publicamente foram os próprios ministros do STF em mais de uma oportunidade.

Sua morte prematura denotou, de imediato, o impacto de sua saída para a estabilidade da Corte. A confirmação de que estava no avião que caiu em Paraty (RJ) desencadeou a discussão de qual seria a melhor interpretação do regimento interno do Supremo para definir quem o substituiria no comando da Lava Jato.

Como escreveu no JOTA o professor Diego Werneck, da FGV Direito Rio, se o Supremo estivesse repleto de juízes com o perfil de Teori Zavascki, a discussão sobre o regimento do Supremo não seria tão acalorada. As interpretações não seriam tão cerebrinas. Porque quem manobra hoje o regimento não procura a melhor interpretação da regra. Por trás da leitura com lupa dos artigos do regimento está a preocupação de que a Lava Jato não caia com A, B ou C ou com um juiz a ser escolhido interessadamente.

Menezes Direito e Teori Zavascki, ambos egressos do Superior Tribunal de Justiça (STJ), chegaram tarde ao topo da carreira, já próximos ao limite dos 65 anos definido pela Constituição. Ambos foram indicados por governos petistas. As escolhas dos dois, coincidentemente, foram das mais rápidas da história do Supremo, tal era a segurança de Lula (que indicou Direito) e de Dilma Rousseff (que escolheu Zavascki).

Menezes Direito e Teori Zavascki levaram para o STF experiência de anos de magistratura e o equilíbrio que se espera de um juiz, especialmente da mais alta Corte do país. Ambos também saíram trágica e prematuramente. Direito foi substituído pelo ministro Dias Toffoli, nomeado por Lula antes do julgamento do mensalão. Quem o presidente Michel Temer indicará para substituir Teori Zavascki e julgar um processo que atinge severamente seu governo e seu partido?

O futuro da Operação Lava Jato sem Teori Zavascki

Com a morte do ministro Teori Zavascki em um acidente de avião, o Supremo Tribunal Federal terá que definir o futuro da Operação Lava Jato, maior investigação criminal do país. Integrantes do STF e investigadores, no entanto, dizem que o caso deve ganhar novo ritmo e pode até sofrer atrasos.

As normas do STF têm previsões diversas. O artigo 68 do regimento do tribunal prevê que em casos de vacância do cargo por mais de 30 dias a Presidência do tribunal pode fazer a redistribuição. O presidente da República, Michel Temer, não tem prazo para indicar o nome que deverá substituir Zavascki.

A medida vale para casos como “habeas corpus, mandado de segurança, reclamação, extradição, conflitos de jurisdição e de atribuições, diante de risco grave de perecimento de direito ou na hipótese de a prescrição da pretensão punitiva”. A norma, no entanto, estabelece que, “em caráter excepcional”, a medida pode ser aplicada pelo presidente do STF nos demais feitos.

O artigo 38 determina que “em caso de aposentadoria, renúncia ou morte do relator o processo ficará com o novo ministro nomeado para a sua vaga” pelo presidente da República.

O artigo 10 do regimento do STF também prevê que os feitos podem ser redistribuídos para integrantes da turma da qual o ministro fazia parte. Teori era integrante da 2ª Turma, ao lado de Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski.

Em 2009, à época da morte do ministro Menezes Direito, o então presidente do STF, Gilmar Mendes, editou portaria autorizando a redistribuição de processos e recursos criminais com réu preso que estavam sob a relatoria do ministro. A decisão pode abrir precedente para uma discussão sobre os processos sob relatoria de Teori Zavascki.

A decisão de Gilmar Mendes para determinar a redistribuição dos processos que eram relatados pelo ministro Menezes Direito determinava também que a escolha do “herdeiro de relatoria” deveria ser feita em obediência ao artigo 10 do regimento interno do STF. O dispositivo diz que a distribuição deve ser feita dentro da turma a qual o ministro falecido pertencia. Teori era integrante da 2a turma do STF. Se a regra for novamente obedecida, a distribuição não seria feita entre os dez ministros do STF mas somente entre Ricardo Lewandowski; Celso de Mello; Gilmar Mendes; e Dias Toffoli.

Do ponto de vista prático, cabe ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ou alguma das partes, pedir ao STF a redistribuição da Lava Jato. O pedido pode, inclusive, indicar a fórmula de redistribuição que seu autor considera mais acertada. Se isso acontecer, o STF deverá decidir incidentalmente – o que pode acontecer por sua presidente, a ministra Cármen Lúcia, ou até mesmo pelo plenário.

Passos

No comando da Lava Jato, o ministro era considerado de perfil técnico e autorizou, de uma única vez, a abertura de uma investigação envolvendo o maior número de políticos. A Lava Jato alcançou dois ex-presidentes da República, ministros de Estados, presidentes do Senado e da Câmara, além de dezenas de senadores e deputados.

Foi pelas mãos do ministro que o STF autorizou a prisão do primeiro senador no exercício do mandato desde a redemocratização, quando a PGR apresentou indícios de que o então líder do governo Dilma, Delcídio do Amaral, tentava atrapalhar as investigações da Lava Jato e evitar a delação do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. De forma discreta, Teori reuniu os colegas da 2ª Turma na véspera e apresentou o caso e ligou para o então presidente do STF Ricardo Lewandowski para informar os passos.

Teori, sob pressão, ainda acabou determinando o afastamento do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara e do mandato diante dos avanços das investigações e da suspeita de que ele usava o cargo para travar as apurações e pressionar aliados. O ministro relutou em tomar a medida pedida pela Procuradoria Geral da República, mas cedeu depois que houve uma articulação para analisar uma ação da Rede que tinha o mesmo objetivo.

O ministro, no entanto, recusou o pedido de prisão feito pela PGR do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), do senador Romero Jucá (PMDB-RR) e do ex-presidente José Sarney.

Na operação, o voto do ministro em 2015 também foi decisivo para a tirar da prisão nove dos maiores empreiteiros do país, que foram para prisão domiciliar e que estava detidos há quase cinco meses por decisão do juiz Sergio Moro, relator da Lava Jato na primeira instância. No ano passado, no entanto, o ministro votou contra a libertação de Marcelo Odebrecht, preso por decisão do Moro.

Começo

Inclusive, Teori Zavascki ganhou a relatoria da Lava Jato depois de ter sido sorteado para analisar uma reclamação do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa que tentava anular a operação. O caso provocou um desgaste entre o ministro e Moro.

Inicialmente, Teori mandou soltar Paulo Roberto e 11 outros acusados de integrar um esquema de lavagem de dinheiro. Moro decidiu questionar a decisão do ministro do STF e determinou a entrega dos autos e da documentação para a Corte.

Zavascki reviu o despacho anterior após ter recebido informações de Sérgio Moro, relatando haver riscos de fuga de parte dos investigados, especialmente daqueles que estariam também envolvidos com tráfico de drogas. Além disso, ele advertiu que dois acusados mantêm contas bancárias no exterior nas quais estão depositados valores vultosos, o que poderia facilitar uma eventual fuga, conforme o juiz.

Segundo advogados que acompanham o tribunal, se não houvesse o recuo de Teori, a Lava Jato poderia ter ganho outros contornos.

Em outros momentos, Teori também questionou atos de Moro, como a divulgação de áudios de interceptação de Dilma e Lula, além de ter feito crítica à força-tarefa pela coletiva com power point para denunciar o petista.

Morte trágica joga STF em águas institucionais revoltas

A trágica morte do ministro Teori Zavascki na tarde desta quinta-feira (19) após a queda de avião no mar de Paraty, litoral sul do Rio de Janeiro, “mergulhou” o Supremo Tribunal Federal e a República brasileira em “águas institucionais revoltas”.

Para além da consternação e perplexidade provocadas no meio jurídico a partir deste triste episódio, quatro questões emergenciais aguardam pronta resolução por parte dos Poderes Constitucionais: a) a definição da relatoria da Operação Lava Jato; b) a esperada retomada, pelo Plenário do STF, do julgamento do Recurso Extraordinário nº 635.659[1], em que se discute a inconstitucionalidade do art. 28 da Lei Federal nº 11.343/06 e a consequente descriminalização ou não do porte de drogas para consumo próprio, cujo julgamento fora interrompido após o pedido de vista do falecido ministro; c) o julgamento do Mandado de Segurança nº 34562[2], com pedido liminar para suspender ato do então presidente do Senado Federal, Renan Calheiros, que encaminhou para sanção presidencial o Projeto de Lei da Câmara 79/2016, que altera a Lei Geral das Telecomunicações, sob relatoria do ministro Teori e d) a indicação, a sabatina pelo Senado e a nomeação de um (a) novo (a) ministro (a) para o cargo em vacância.

A resolução dessas questões passa pela interpretação de normas regimentais do próprio STF, constante nos artigos 38 e 68. Referidos artigos tiveram sua redação redefinida através da Emenda Regimental nº 42/2010[3], a partir da edição da Portaria nº 174/2009[4] pelo então presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, quando da morte do ministro Menezes Direito em 2009, a qual pode servir de relevante precedente para o deslinde desse inesperado imbróglio institucional.

De acordo com o artigo 38, inciso IV, alínea a do Regimento Interno do STF[5], em caso de aposentadoria, renúncia ou morte, o relator de um processo é substituído pelo ministro nomeado para a sua vaga pelo presidente da República[6].

Em contrapartida, há ainda a previsão regimental constante no artigo 68, caput[7], na qual se admite, em caráter excepcional, a determinação de redistribuição dos processos pela presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, mediante requisição da parte interessada ou do representante do Ministério Público, o procurador-geral da República Rodrigo Janot.

Referida redistribuição, que assegura o respeito ao princípio do juiz natural, pode contar contudo com a estipulação do critério constante no artigo 10, RISTF, o qual prevê que os feitos podem ser redistribuídos para integrantes da turma da qual o ministro fazia parte. Assim sendo, referidos processos, incluindo os da Lava Jato, poderiam ser redistribuídos apenas aos ministros integrantes da 2ª Turma restantes: Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski, ao invés de todos os componentes do plenário do STF, excetuando-se a presidente da Corte, conforme praxe institucional.

Todavia, a hipótese preceituada pelo artigo 68, RISTF, pressupõe a ausência ou vacância do cargo por mais de trinta dias, apresentando-se assim residual, tendo em vista que, diferentemente da última nomeação para substituição da vaga do ministro Joaquim Barbosa pelo então advogado e professor Edson Fachin que demorou quase nove meses, esta pode ser promovida de pronto pelo presidente provisório, Michel Temer.

Em meio a todo esse turbilhão, Teori deixa como herança à mais alta Corte do país aproximadamente 100 inquéritos e ações penais, bem como a responsabilidade de não fazer naufragar a Lava Jato, quando se aguardava, dentre outras, a homologação da bombástica delação premiada de 77 executivos e ex-funcionários da Odebrecht, nas quais constam nomes de mais de 200 políticos, incluindo inúmeras citações ao presidente da República provisório, Michel Temer, e a pelo menos 15 senadores, acusados de envolvimento com desvios de verbas públicas da Petrobrás e de outras empresas públicas, sendo estes responsáveis pela indicação e nomeação do (a) novo (a) ministro (a).

Diante da imponderável sobrecarga institucional impingida ao STF com a morte trágica de um de seus membros, bem como das inúmeras decisões hercúleas pendentes e novas demandas já pautadas quando do retorno do recesso judiciário, a prudência jurisdicional exige na atual quadra da história brasileira, principalmente após recentes e profundas rupturas institucionais, um postura da Corte que evite mais um novo constrangimento inter poderes.

Assim, sugere-se à presidente Cármen Lúcia que proceda gestão no sentido de transferir um ministro da 1ª para a 2ª turma, a fim de evitar que o presidente da República e senadores citados na Lava Jato indiquem e nomeiem um julgador que poderá julgá-los. Esta medida, inclusive, já fora tomada em março de 2015, no começo da própria Lava Jato, quando a 2ª turma do STF se encontrava há praticamente seis meses incompleta, em razão da vaga em aberto deixada pelo ministro Joaquim Barbosa. Vaga esta que foi preenchida pelo ministro Dias Toffoli, após sugestão do ministro Gilmar Mendes e apoio do próprio ministro Teori Zavascki e Celso de Mello, contando com a desistência do ministro Marco Aurélio, que detinha a preferência na escolha[8].

Mais uma vez o “Sobrenatural de Almeida”, como dizia Nelson Rodrigues, parece passar a “bola” para o ministro Marco Aurélio.

———————————–[1] O 27º relatório global da organização Human Rights Watch, divulgado na quinta-feira (12), aponta a Lei Federal nº 11.343/2006 como “um fator chave para o drástico aumento da população carcerária no Brasil”. PEREIRA, Néli. Lei de Drogas é ‘fator chave’ para aumento da população carcerária, diz ONG. BBC Brasil. 2017. Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/brasil-38590880>. Acesso em: 19 jan. 2017. A íntegra do RE 635.659 encontra-se disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciarepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=4034145№Processo=635659&classeProcesso=RE№Tema=506>. Acesso em: 19 jan. 2017.[2] O Mandado de Segurança em questão destaca que o projeto denominado Lei Geral das Telecomunicações produz efeitos da ordem de R$ 100 bilhões, segundo avaliação do Tribunal de Contas da União, uma vez que “opera uma mudança radical na prestação de serviços de telecomunicação, com a conversão de contratos de concessão para autorização, perdão de multas, transferência de patrimônio público para empresas privadas” e, em razão disso, sustentam que a matéria não poderia ter sido apreciada “com açodamento e irresponsabilidade”. Assim, considerando presente o perigo de demora para a decisão diante da iminência de assinatura da matéria por parte do presidente da República, os senadores pedem a concessão da liminar para que o projeto não seja enviado à sanção presidencial antes de ser apreciado pelo plenário do Senado. A íntegra do MS 34562 encontra-se disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=34562&classe=MS∨igem=AP&recurso=0&tipoJulgamento=M>. Acesso em: 19 jan. 2017.

[3] Íntegra disponível em: <http://www.stf.jus.br/ARQUIVO/NORMA/EMENDAREGIMENTAL042-2010.PDF>. Acesso em: 19 jan. 2017.[4] Íntegra disponível em: <http://www.stf.jus.br/ARQUIVO/NORMA/PORTARIAPR174-2009.PDF>. Acesso em: 19 jan. 2017. Dentre os processos que fazem referência à presente Portaria podemos citar a título de exemplo: Embargos de Declaração no Inq 2168 RJ, distribuído em caráter excepcional ao Ministro Joaquim Barbosa. Disponível em: <www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoTexto.asp?id=2824881&tipoApp=RTF>. Acesso em: 19 jan. 2017 e HC nº 99.154/SP, distribuído ao ministro Marco Aurélio, em substituição ao ministro Menezes Direito. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoTexto.asp?id=2770102&tipoApp=RTF>. Acesso em: 19 jan. 2017.[5] Art. 38, RISTF – O Relator é substituído:

IV – em caso de aposentadoria, renúncia ou morte: a) pelo Ministro nomeado para a sua vaga; b) pelo Ministro que tiver proferido o primeiro voto vencedor, acompanhando o do Relator, para lavrar ou assinar os acórdãos dos julgamentos anteriores à abertura da vaga; c) pela mesma forma da letra b deste inciso, e enquanto não empossado o novo Ministro, para assinar carta de sentença e admitir recurso.

[6] Registre-se arguta interpretação constitucional do artigo 101, caput e parágrafo único, da CF: “a Constituição Federal estabelece que cabe ao presidente da República a nomeação, após a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. Dessa forma, o ato do Presidente é o último e não o primeiro, como ainda cremos. Na verdade, são três atos: indicação, escolha pelo Senado e nomeação pelo presidente da República. Logo, há uma lacuna constitucional, pois não se definiu quem indica para a escolha pelo Senado, a qual é conhecida como sabatina. Atualmente, estamos confundindo nomeação com indicação. Não se nomeia para escolher, mas sim o contrário, escolhe-se pelo Senado para ser nomeado pelo presidente da República. Portanto, não há motivo jurídico para que o Senado fique aguardando a indicação do candidato a ministro do STF pelo presidente da República, pois a Constituição Federal não define assim. De fato, há uma tradição de que o presidente da República indique e esta concepção segue a tradição do direito norte-americano”. MELO, André Luís. Mera tradição: presidente apenas nomeia ministros do Supremo. Revista Consultor Jurídico, 7 de fevereiro de 2011. Disponível em: >. Acesso em: 19 jan. 2017.[7] Art. 68. Em habeas corpus, mandado de segurança, reclamação, extradição, conflitos de jurisdição e de atribuições, diante de risco grave de perecimento de direito ou na hipótese de a prescrição da pretensão punitiva ocorrer nos seis meses seguintes ao início da licença, ausência ou vacância, poderá o Presidente determinar a redistribuição, se o requerer o interessado ou o Ministério Público, quando o Relator estiver licenciado, ausente ou o cargo estiver vago por mais de trinta dias (grifo nosso).§ 1º Em caráter excepcional poderá o Presidente do Tribunal, nos demais feitos, fazer uso da faculdade prevista neste artigo.

Registre-se que, diferentemente do constante no referido artigo, no artigo 1º da Portaria nº 174/2009 estabeleceu-se a distribuição dos processos sob relatoria do ministro Menezes Direito independentemente do pedido das partes. [8] Antes do deferimento do pedido, o Ministro Lewandowski consultou o ministro Marco Aurélio, integrante mais antigo da 1ª turma, acerca de eventual interesse de sua parte, mas o ministro declinou da transferência. Conforme o artigo 19, RISTF, a preferência na movimentação é do ministro mais antigo.

Art. 19. O Ministro de uma Turma tem o direito de transferir-se para outra onde haja vaga; havendo mais de um pedido, terá preferência o do mais antigo.Segue despacho do ministro Lewandowski há época: “Consultado o ministro Marco Aurélio, que declinou da transferência, defiro o pedido do ministro Toffoli, nos termos do artigo 19 do RISTF”. MIGALHAS, Teori pode ser substituído por ministro da 1ª turma. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI252156,91041-Teori+pode+ser+substituido+na+Lava+Jato+por+ministro+da+1+turma>. Acesso em: 19 jan. 2017.

Fonte: JOTA

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Neste momento, pensando-se com Sabedoria, Discernimento e Equilíbrio, a Presidente do STF, Ministro Carmen Lúcia, tem por Justiça o Dever de indicar, de imediato, o Ministro Marco Aurélio Mello para a Segunda Turma do STF, preenchendo a lacuna deixada pelo falecimento do Ministro Teori Zavascki e evitando, assim, que haja a fragmentação da Continuidade de Solução para a Operação Lava-Jato, a qual atende aos anseios de todos os brasileiros, principalmente, para que sejam, Com Urgência Urgentíssima, homologadas as delações premiadas da Odebrecht. continuar lendo